Liberdade de expressão e discurso de ódio nas redes sociais

Objetivo: Realizar uma análise das liberdades na sociedade de direitos, em especial a liberdade de expressão.

O termo “liberdade de expressão” foi brandado aos ventos como se fosse uma poeira qualquer, mas não o é. Talvez pelo fato de termos uma constituição com pouco mais de 30 anos, e uma democracia que ainda se engatinha, muitos acabam por julgar a liberdade de expressão como um bem absoluto e sobre todos os outros, um direito que se sobrepões aos demais por ser o primeiro, visto que a liberdade ensejaria o precursor de todos os outros direitos.

INTRODUÇÃO

A liberdade de expressão não deve ser entendida como um instituto isolado dos demais segmentos que compõem o tecido social, por exemplo o direito individual, aspectos morais e respeito às minorias sociais. Na atual sociedade, com amplo acesso a ferramentas que ampliam a voz das pessoas, os cidadãos tendem a ter a deturpada ideia que a liberdade de expressão acompanha a liberdade tecnológica que avança na sociedade, e isso acaba criando uma celeuma que afeta grupos sociais há muito tempo vitimizados na sociedade e que agora além das chagas históricas que carregam em suas origens e caminhada, também precisam lidar com ataques massivos em redes de computadores, os conhecidos discursos de ódio.

OBJETIVO

Realizar uma reflexão sobre a problemática das liberdades de expressão na era dos direitos, fazendo uma análise do que pode ser considerado liberdade de expressão e quando isso ultrapassa esse conceito, se configurando como discurso de ódio ou confronto com as demais liberdades individuais.

A liberdade é conseguida obedecendo à lei ou confrontando-a?

A pesquisa em apresentação teve como escopo o estudo de material bibliográfico bem como análise de dados e matérias sobre a problemática, tendo dessa forma uma experiência prática dos preceitos teóricos e metodológicos acerca do tema.

A liberdade de expressão deve ser entendida como um todo com os demais direitos do homem brandados durante a revolução francesa. Naquele momento o anseio para se libertar do absolutismo era grande e urgente. Mas a sociedade mudou. E agora um direito como a liberdade deve ser limitado para que outros possam inclusive fazer uso desse mesmo direito: a liberdade. Exercer a liberdade absoluta sem limitação moral, social, material caracteriza tirania. Somente um tirano, dispondo de poder absoluto exerce suas vontades sem nenhuma limitação. Até mesmo filósofos anarquistas, a exemplo de Michail Bakunin, não eram adeptos de uma liberdade e poder absoluto, pois sabia que ela levava ao encontro daquilo que primariamente tentou se combater: a tirania. Em outro momento da história, Karl Poper nos apresenta o Paradoxo da Tolerância, no qual firma ser perigoso ser tolerante com os intolerantes, pois essa tolerância seria o começo da ruína da democracia, pois o intolerante se aproveita de tal espaço para roubar seu direito à liberdade. Dessa forma, não é válido o argumento de que a liberdade para ser tal como sua definição, deve ser absoluta e permitir que dela façam qualquer uso de qualquer forma que por si próprio acharem necessária, sem qualquer consideração ao outro em sociedade.

            No âmbito teórico, poderíamos imaginar uma sociedade em que todos tivessem liberdade de expressão irrestrita e dela fizessem uso sem qualquer regulamentação para punição ao discurso de ódio. Mas na prática podemos perceber que a liberdade irrestrita não pode existir em uma democracia, somente onde houver uma tirania é possível que haja uma liberdade sem limites. E essa liberdade ainda não seria usada pelo povo, mas apenas pelo tirano que dela faria uso ao seu próprio entendimento de limite. Nesse contexto, percebemos que a liberdade irrestrita ao povo não existe, nem mesmo em regimes autoritários, pois se o povo fizesse uso dela teriam como punição a ira do tirano que está sempre acima de seu povo.

            Dessa forma, a liberdade de expressão não pode ser entendida como a liberdade de ofender os outros gratuitamente, sem qualquer punição. A nossa constituição em seu Art. 5º, IX esclarece: “IX – É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;” Mas um pouco antes de nos dar a liberdade de expressão, nos alerta: V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;” (Constituição Federal, 1988.)

Liberdade de expressão

            Recentemente, durante palestra na USP, o Ministro do STF Alexandre de Moraes lembrou os limites da liberdade de expressão em uma sociedade democrática de direitos. Nos esclarecendo que: “Não é possível defender volta de um ato institucional número cinco, o AI-5, que garantia tortura de pessoas, morte de pessoas. O fechamento do Congresso, do poder Judiciário. Ora, nós não estamos em uma selva. Liberdade de expressão não é liberdade de agressão”.

            Embora não esteja legitimado em nenhum ordenamento a conceitualização do que vem a ser discurso de ódio, é possível percebermos levando em consideração julgados de tribunais, que ele se perfaz quando um determinado indivíduo usa sua liberdade para atacar minorias, determinados grupos sociais vulneráveis.

            Dito isso de outra forma, o discurso de ódio leva como pano de fundo a liberdade individual em sociedade, ainda que essa noção seja falha como mencionado anteriormente. Usar da prerrogativa de liberdade individual para agredir os demais indivíduos na sociedade, não deve ser considerado como um direito de expressão, mas um atentado ao outro, seja um atentado físico ou não. Dessa forma, o discurso de ódio como justificativa de liberdade não pode ser usado em uma sociedade que preze pela democracia e pela legitimação de condutas que visam a evolução social, práticas que melhorem a vida em sociedade e façam com que ela seja ainda mais agradável.

            Levando isso em consideração, temos, portanto, uma dicotomia a ser explicada e esclarecida a todos da sociedade: sua liberdade não pode colocar a vida e existência alheia em risco gratuitamente sem que isso gere uma punição, é o que foi decido como pacto social. Renunciamos a certas individualidades e animalidades, em detrimento de um bem maior: o coletivo.

CONCLUSÃO

As redes sociais abriram portas que não imaginávamos, seja as que encurtam e até revelam pessoas há muito desaparecidas, como também portas em que saem os piores sentimentos humanos. Uma caixa de pandora da modernidade. Usar esses meios democráticos com justificativa para propagar o ódio tendo como base a pretensa liberdade de expressão, é querer retroceder à barbárie. Usar os métodos que deveriam ser para aproximar pessoas e nações para antes separá-las, quando não as exclui.

Texto publicado no III Congresso Internacional de Direito e Inteligência Artificial
– A inteligência artificial e os desafios da inovação no Poder Judiciário, ocorrido em formato
híbrido nos dias 08, 09 e 10 de junho de 2022.